terça-feira, 16 de março de 2010

O RIBULIÇO

Tava Raimundinho no maior flerte com a nêga Sulamita, quando um comichão começou a subir desde a sola do pé até a cumieira do quengo, passando pela maria Joana, espinhela e tripa gaiteira, causando o maior ribuliço, o maior alvoroço nos grugumins do nego, assulerando o coração, deixando Raimundinho apoquentado, arretado, agoniado que não dava mais pra suportar, até que decidiu tomar tento e dar uns apertos em Sulamita.

O Negrinho respirou fundo, levantou o toitiço, arrumou o cachaço e decretou:

- Vou dar uns acôcho nessa nêga e vai ser agora, nestante.

Sulamita era uma nêga meio troncuda, beiço grosso, peitos pequenos, cinturinha de pilão e cadeiras que mais pareciam feitas de mola, de tanto que balançavam. Era uma nêga reboculosa demais, nêga faceira, dessas que deixam a gente nos cascos, arretado e sem juízo.

Raimundinho deu o sinal e a Nêga entendeu foi logo.

Era pra ir pra detrás da casa paroquial, a Nêga sabia que lá existia um cantinho reservado, aconchegante, que era o que eles mais precisavam.

Quando Raimundinho chegou, Sulamita já estava lá, chega tava de venta acesa.

Só foi a Nêga avistar Raimundinho, deu um pinote, se abufelou com o pescoço do nego, o nego se abufelou com ela, os dois se abufelaram de tal maneira que ficava difícil, quase impossível, saber o que era de Raimundinho e o que era de Sulamita, quem era Raimundinho e quem era Sulamita.

Eles estavam tão amucegado, mas tão bem amucegado que não perceberam o ribuliço que se formava em torno deles.

É que Dagoberto, apesar de ser um negão forte, de quase dois metros de altura, era meio abestaiado, muito roliço pros gostos da nega Sulamita e por isso, levou um fora da Nêga.

O negão vivia jururu, capiongo e vivia pastorando a nêga. Ele notou o sinal que Raimundinho fez pra Sulamita e, ferido nos brios, virou fera ferida e, coração em alvoroço, gritou pra quem quisesse ouvir:

- Vou pegar esses dois no furdunço, vai voar caco de nêga pra tudo que é lado e esse xibungo, esse fi de quenga vai ver com quantos tabefe se faz um resto de home.

Raimundinho era um cabôco desses atarrachado, meio amarelo, meio índio com um quinhão

de negro mas, acima de tudo, era safado. Desses que apesar de não valer um traque, não valer nem um cibasol, consegue agradar; toda gente gosta dele talvez por ser tão safado.

E, talvez tenha sido também por isso mesmo, que a nêga Sulamita tenha se interessado tanto pelo safado do Raimundinho. O danado parece que sabia acaititar as mulheres, sabia como “pilotar” uma nêga daquele “quilate”.

Dagoberto foi certeiro, foi direto, ele já sabia da existência do cantinho, Sulamita já havia levado ele lá mas, ao que parece, ele não soube “aproveitar as delícias” do lugar, ou da nêga.

Ele chegou e foi logo gritando:

- Raimundim seu fí d’uma égua, solta essa nêga que agora ce vai se abufelar é mais eu. Agora ce vai ver o que é quiprocó, agora ocê vai ver o que é fuzuê, e essa nêga vai aprender a respeitar os sentimento que eu sinto por ela.

Raimundinho ainda pensou em dar um catiripapo em Dagoberto e se escafeder no oco do mundo mas, viu logo que não era um bom negócio pra ele, medir forças. Um cangapé só de Dagoberto podia desmontar todo seu esqueleto.

Aos poucos foi se desapregando da nêga, ganhando tempo, arrumando as idéias e, não se sabe como nem de onde ainda arranjou coragem para falar grosso com Dagoberto:

- Óia aqui “Dagô”, nois num tava fazendo nada demais , visse???

A “intimidade” do “ Dagô”, mais o descaramento de Raimundinho, deixaram Dagoberto ainda mais furioso. O cabra fungou, botou “fogo” pelas ventas, ciscou mas, no ferver da ira, perdeu Raimundinho. O neguinho escapuliu numa desabalada carreira, despinguelou no oco do mundo numa carreira tão medonha que, dizem a boca pequena, foi parar em São Paulo onde arrumou um emprego de foguista da Estrada de Ferro Bragança Paulista.

Quanto a Dagoberto, esse conseguiu casar com a nega Sulamita mas, com uma condição imposta por ela:

- Nosso primeiro filhinho vai se chamar Raimundo, viu meu “GOSINHO”???

Dagoberto “não entendeu muito bem” essa exigência da nega mas, era besta de num aceitar????

Abestaiado – abobalhado , bobo, imbecil

Abufelar - agarrar

Abufelaram - agarraram

Acaititar - acariciar

Acocho - arrocho

Amucegado – pendurado, pregado

Apoquentado – afobado,

Arretado – excitado, com raiva

Assulerando - acelerando

Atarrachado – baixo e grosso

Cabôco - caboclo

Cachaço – parte posterior da cabeça, toitiço

Cangapé – ponta pé dado na batata da perna do outro

Capiongo – tristonho, macambuzio

Catiripapo – golpe de capoeira

Cibasol – antigo comprimido para dores e má digestão

Comichão - Sentimento de aflição, impaciência, ansiedade

Cumieira - culminante, cume

Despinguelou – soltou-se, correu

Escafeder – sumir, desaparecer

Escapuliu - soltou

espinhela - o apêndice xifóide

Flerte - Namorico inconseqüente

Fi de quenga – filho de prostituta

Furdunço – barulho, desordem

Fuzuê – furdunço, barulho, confusão

Grugumins – gorgomilos, goela, garganta

Jururu – tristonho, acabrunhado

mais eu - comigo

maria Joana – osso da parte interna e final da perna, junto ao tornozelo

Nestante – nesse instante

Nos cascos – em ponto de bala, excitado ao extremo

Quengo - Bras. Pop. Cabeça.

Quiprocó – qüiproquó, confusão

Reboculosa – faceira, frajola

Ribuliço – reboliço, confusão

Roliço - gordo

Toitiço – parte posterior da cabeça, nuca, cachaço, toitiço

Tripa gaiteira – intestino grosso

Xibungo – xulo, pederasta

2 comentários:

XICO BIZERRA disse...

texto muito bom, mané. gostaria de tê-lo escrito. parabéns.

XICO BIZERRA disse...

esse FRANCISCO aí de cima sou eu, Mané,: XICO BIZERRA.